Publicado 12 de maio de 2020 22:22. última modificação 12 de maio de 2020 22:22.

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Pense Brasil define a necessidade de uma frente ampla esquerda para enfrentar o governo Bolsonaro

Com o objetivo de promover diálogos de um novo Brasil, a Fundação João Mangabeira (FJM), ligada ao Partido Socialista Brasileiro (PSB), realizou nesta segunda-feira, 11 de maio, a 6ª edição do Pense Brasil Virtual, que discutiu os desafios e requisitos para um projeto democrático e avançado. Mediado pelo presidente da FJM, Ricardo Coutinho, o debate online reuniu 5 líderes de partidos do campo democrático: Carlos Siqueira, presidente nacional do PSB; Gleisi Hoffmann, deputada federal e presidente nacional do Partido dos Trabalhadores; Marcelo Freixo, deputado federal pelo PSOL/RJ; Luciana Santos, vice-governadora do Pernambuco e presidente nacional do PCdoB; e Roberto Requião, ex-senador e ex-governador do Paraná.

Que país é esse?

Ricardo Coutinho lançou a questão de que país é este em que vivemos hoje, e convidou-os a pensar em como chegamos à situação presente. Carlos Siqueira, presidente do PSB, sinalizou que todos à esquerda do espectro político têm um grau de responsabilidade por chegarmos à situação que nos encontramos hoje, em nossa pior situação em 50 anos de vida política do país. “Em nenhum outro momento da república o país teve uma liderança tão degradante para a imagem do Brasil. O retrocesso é monumental, e essa liderança teve o apoio de uma elite escravocrata que não mediu as consequências de colocar o país no risco em que ele se encontra atualmente”. Siqueira constatou que estamos distantes como nunca estivemos de um caminho de desenvolvimento nacional e de uma visão estratégica de tecnologia, de ciência e educação, saúde e direitos sociais. “O que se encontra em risco, e em risco muito grave, são as instituições democráticas e a própria democracia. Os direitos sociais já estavam sendo cortados desde o impeachment da presidenta Dilma, com o governo Temer e mais ainda com o governo Bolsonaro. Hoje, a pandemia mostrou ainda mais o grau de deterioração desses direitos e o tamanho desse presidente que está muito aquém da cadeira que ocupa”.

“Um país é o resultado de sua história e a nossa história de 500 anos explica o que é o Brasil hoje: quando há conquistas e avanços materiais das classes mais baixas, dos pobres, temos uma reação violenta da elite como tivemos recentemente depois do impeachment – do golpe – contra a presidenta Dilma Rousseff”, denunciou Gleisi Hoffmann, presidente nacional do Partido dos Trabalhadores. “São cabeças escravocratas, de elite, que fazem com que tenhamos uma reforma trabalhista como tivemos no governo Temer e como se continuou no governo do Bolsonaro”, apontou. “Então, esses trinta e poucos anos que vivemos hoje de democracia foi uma conquista do povo, mas que a elite não dá conta, ela não suporta e quer voltar aos tempos de antes, quando o Estado era cooptado para que uma parte menor da sociedade pudesse ter as suas benesses, pudesse ter a sua riqueza protegida. Por isso a mania de proteger banqueiros, proteger sistema financeiro, os ricos e de ter dificuldade de fazer taxação progressiva, não taxar grandes fortunas, não taxar lucros e dividendos por mais que a gente tente. Toda vez que o país dá um passo, tenta melhorar, lá vem o processo da discriminação e da criminalização da política, que é um instrumento da democracia. Foi assim com Getúlio, foi assim com Jango e está sendo assim nesse momento”, completa Gleisi.

A vice-governadora de Pernambuco e presidente nacional do PCdoB Luciana Santos afirmou que a situação em que vivemos hoje no país assemelha-se a um pesadelo. “A derrota estratégica do campo da esquerda em 2018 foi a vitória da extrema-direita brasileira com a característica que temos: com corte fascista e negacionista da ciência. Vivemos um tempo em que precisamos afirmar o óbvio. Mas também é importante observarmos que isso não é um fenômeno apenas brasileiro. É um fenômeno mundial fruto talvez da crise de 2008, que levou a muitos impasses, sobre as alternativas e modelos que estão em curso no mundo”, salientou. Luciana lembrou que as forças conservadoras brasileiras e o real poder fizeram a opção por essa solução nefasta e que mesmo o mercado financeiro decidiu apostar nessa figura que encarnou o antissistema sem sê-lo. “Aliás, é o que de mais velho há na política, alguém que teve 28 anos de mandato e passou por nove partidos e ainda assim conseguiu encarnar o antissistema.

A vice-governadora também afirmou que a pandemia acelera a mudança de época e tem impactos na geopolítica. “A covid-19 é um vetor de crise econômica, social e do imaginário coletivo, porque causa medo e indignação pelos seus efeitos devastadores, pela sua letalidade e pela sua velocidade de contágio e de ceifar vidas. Tanto que compara-se a outros fatos devastadores da história como a crise de 29 e a segunda guerra mundial, exatamente pela consequência dos efeitos devastadores desse fenômeno”. Ela ressalta que a doença chega ao Brasil em meio a uma política de Estado mínimo e a um conceito de verdadeira cruzada de desmonte do Estado, onde vivemos incertezas e instabilidades. “Mas é preciso afirmar o caminho: a alternativa é um Estado forte e à altura dos desafios como está acontecendo em toda parte do mundo. Nunca se praticou tanto keynesianismo no mundo como hoje. Estamos vendo consenso em tudo o que é matriz ideológica da economia sobre o aumento de gastos públicos”.

Roberto Requião, ex-senador e ex-governador do Paraná vê hoje uma absoluta falta de identidade entre o pessoal que embarcou no capital financeiro e os ricos em geral com a população brasileira. “Eles não se identificam com o povo do país, se dizem patriotas sem serem patriotas, se reconhecem mais com os ricos do mundo, com as populações mais avançadas do planeta Terra e não têm rigorosamente nada a ver com a população brasileira”, salienta. Requião também aponta que o que elegeu  Bolsonaro foi uma insatisfação popular que é recorrente no país. “E é recorrente há muito tempo: o Lula sofreu essa insatisfação com desacertos na economia, Fernando Henrique a mesma coisa e o Collor também. Mas na sequência faltou para todos eles um projeto para o Brasil: um projeto de independência e de industrialização”. 

Por sua vez, o deputado federal Marcelo Freixo, do PSOL/RJ, trouxe a informação de que o presidente Bolsonaro acabara de lançar um decreto considerando salões de beleza, barbearias e academias como serviços essenciais, e que ele fez isso para desafiar os estados da federação e outras instituições. “O mundo enfrenta uma pandemia, mas só o Brasil enfrenta também um pandemônio. Essa atitude genocida de Bolsonaro vai custar muito caro ao país. Ele foi eleito pelo que sempre foi, um defensor da ditadura e da tortura, e hoje ele ainda tem 30% de pessoas que consideram boa e ótima a maneira como o país é conduzido”.

Frente política

Para que haja um eficiente enfrentamento dessa crise, o mediador Ricardo Coutinho e os participantes do debate concordaram na formação de uma frente política progressista e trouxeram suas contribuições sobre como tirá-la da teoria para o presente e para o futuro.

Gleisi Hoffmann apontou que os direitos básicos e elementares da população é o que devem balizar essa união democrática. “Termos um governo de extrema-direita, com potencial risco de autoritarismo, ultraliberal e que quer destruir o povo. É o resultado da visão da elite brasileira que teima em tentar voltar atrás, ou seja, em ter um padrão de domínio e de exclusão, em que a riqueza fica extremamente concentrada na mão de poucos. Infelizmente é com essa realidade que nós lutamos e com ela que temos cada vez mais que lutar para que a base democrática se consolide.”

Já Roberto Requião lembra que devemos ter uma frente política que se suporte e que um projeto político adequado trará a massa da opinião pública. O ex-senador considera que não se pode trazer figuras como Fernando Henrique Cardoso e Rodrigo Maia para uma frente que pode se tornar exageradamente ampla. “Essas pessoas, se trouxermos para nossa frente, vão garantir somente suas posições. São apenas operadores do sistema, do capital financeiro e dos bancos, e não acho que essa abertura nos leve a lugar algum”.

Marcelo Freixo pensa que deve haver uma frente anti-bolsonarista comprometida com a democracia. Além disso, o deputado assinala que a covid-19 pode produzir um milhão de mortos no país – segundo profissionais da Fiocruz – e que depois disso haverá profundas mudanças, mas ainda assim o país não será um Brasil de consenso. “A pandemia reforçará a característica escravocrata da elite brasileira, porque a maioria dos que vão morrer são da massa pobre”, aponta Freixo. “O presidente representa um projeto de morte e só conseguiremos reduzir esse apoio que ele tem hoje se conseguirmos vender uma proposta progressista de país. Então nossa frente – o que é muito importante – tem que superar as limitações partidárias as limitações de nome e apresentar um projeto capaz de deter o Bolsonarismo”, completa.

Sem apoio popular não existe um projeto nacional de desenvolvimento, ressaltou Carlos Siqueira. “Portanto, acho que é um importante momento de reflexão para que as forças ideológicas como as nossas possam repensar o sistema político, eleitoral e partidário. E a grande questão estratégica hoje é a manutenção da democracia. Temos que juntar todas as forças democráticas que hoje se opõem a esse governo e que defendem a democracia brasileira e depois retomarmos um projeto de desenvolvimento capaz de oferecer à sociedade uma visão muito diferente da que está em voga hoje”, assinala.

Luciana Santos lembra que mesmo as revoluções brasileiras também reuniram pensamentos díspares e aponta a oportunidade no crescente isolamento de Bolsonaro. “Precisamos explorar todas as contradições que esse bolsonarismo enseja para construirmos uma frente de salvação nacional. É em momentos de crise como esse que se afirma a questão do Estado nacional e de políticas públicas arrojadas. De políticas que possam garantir a proteção social e o cuidado com as pessoas em momentos tão agudos”, ressaltou. “E se a frente ampla é uma necessidade para enfrentarmos a força do bolsonarismo no Brasil, a nossa unidade é mais cara ainda porque ela que vai ser o vetor de uma perspectiva estratégica para a gente. E debates como esse servem para afirmar pensamentos de convergência para o Brasil”, completa a presidente do PCdoB.

Superação das diferenças

Ricardo Coutinho disse que esse é exatamente o espírito que a FJM expressa: “construir um campo que na prática possamos estar muito juntos – no presente e no futuro. E esperamos superar nossas diferenças em nome das necessárias convergências que o Brasil reclama às forças democráticas do nosso país, principalmente diante dessa situação calamitosa, pré-anárquica que nós já estamos vivenciando em nosso país, com sinais claros de tentativas de estabelecimento de um Estado de exceção”, finalizou Coutinho.

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